quarta-feira, 11 de novembro de 2015

Relato de parto: Vanessa e Letícia - visão da doula

A Vanessa me ligou por volta das 5h da manhã, contando que sua bolsa havia rompido. Por volta das 7h, as contrações já estavam bem doloridas, e fui para a casa dela. Chegando lá, achei que ela estava muito abatida, e tinha razão: os vômitos foram super intensos e ela não conseguia comer. Ao longo do dia. César e eu tentamos de tudo: suco, chocolate, castanha, pão, mel... Mas nada parava no estômago da Vanessa, à exceção de pequenos goles de água ou chá.
Às 9h, seguimos para o consultório do dr. Marcondes. Ela foi avaliada e a dilatação estava em 1cm, com o colo ainda grosso, rígido. Vanessa fez um cardiotoco e já então manifestou o desejo de fazer uma cesariana, pois as contrações estavam doloridas demais. César e eu conversamos bastante, com todo carinho, e combinamos de ir para a casa de uma amiga da Vanessa que ficava bem pertinho do Santa Luzia [Martita, nem te conheço, mas já te considero pacas! Que refúgio foi a sua casa em um dia tão tumultuado!].
Na casa da amiga, Vanessa conseguiu relaxar, dormir um pouco, e já acordou com outra feição. Comeu um pouco de açaí e estávamos conversando quando o doutor Marcondes ligou, porque havíamos ficado de retornar ao meio-dia para nova avaliação e já eram quase 13h.
Embora o colo estivesse mais fino e maleável, a dilatação não havia progredido nada e a Vanessa, muito calma e muito segura, disse que queria partir para uma cesariana. Não se tratava de uma mulher em fase de transição, na famosa hora da covardia, querendo desistir quando o trabalho de parto estava quase no final. O trabalho de parto dela ainda estava no início, ela estava muito segura e tranquila quando decidiu que não queria mais. E aí, doula? Você acompanha, nesse caso? É CLARO QUE SIM! Ela é quem sabe a intensidade das dores que estava sentindo, os limites dela, o cansaço, a fraqueza... A decisão é dela, o corpo é dela! Nossa, então ela sentiu dor à toa? É CLARO QUE NÃO! A Vanessa pôde ter a certeza de que sua filha estava pronta para nascer (certeza que só é possível ter com o trabalho de parto) e as duas passaram por várias contrações, o que permitiu um maior amadurecimento dos pulmões da Letícia e todo um coquetel de ocitocina que ambas receberam.
Dr. Marcondes então encaminhou para a cesariana. Estávamos com bastante bagagem, então me permiti não acompanhar a cirurgia (já que eles nunca deixam a gente ficar com a mulher no momento em que eu mais gostaria, que é depois que o bebê nasce e é levado para os procedimentos) e alguém precisava receber e abrir o quarto, achei que seria mais útil do lado de fora, hehe.
Assim, às 15h20, com 50cm e 2,540kg, nasceu a linda diva Letícia. Segundo o médico, a posição dela não estava favorável, então tudo indica que seria um trabalho de parto longo e dificil. Estive com Vanessa logo no pós-parto, segurei a pequena no colo, conversamos muito sobre todo o processo. Saí com o coração tranquilo e feliz!


Relato de parto da Rosana e do Miguel - visão da doula - 07.10.15


Eu e Rosana nos conhecemos a pouco menos de um mês. Ela já é mãe da linda Lavignia (parto normal sem indução), de três anos, e estava a espera do Laerte Miguel. Esse pouco tempo foi de muita intensidade para nós. Rosana viveu nesse tempo questões emocionais delicadas para qualquer mulher, em qualquer fase da vida. Em especial ao final de uma gestação.
Nas dores e dúvidas desse momento, nos apegamos mais ainda uma a outra a visitei quase semanalmente nessas semanas. Lavignia transformou-se em uma mini doula. Quando eu chegava, ela já corria atrás do balde pro escalda pés, conhecia os óleos de massagem e as divisórias de minha bolsa e sempre me ajudou na sagrada tarefa de "cuidar da mamãe". Um dia em especial me marcou: Rosana estava deitada, recebendo uma massagem com rebozo, a pequena, em sua cadeirinha rosa ao lado não quis ficar de expectadora. Puxou a mão da mãe, e começou a massagear. Pura conexão. Puro instinto. Puro amor.
A DPP era pro dia 30 do mês passado. Uma gestação sem intercorrências biológicas/fisiológicas, apesar da cabeça (literalmente) a mil. Sentia como um desafio fazê-la desacelerar um pouco. O mental ocupava todo o espaço e o corpo seguia sereno. 38 semanas, 39, 40. Pressão por todos os lados, ansiosidade crescente. Segunda-feira foi para nova avaliação e a indução foi indicada para a quarta. A ideia original dela era de ir trabalhar de dia, voltar para casa, tomar banho e ir induzir. Combinei de visita-la na terça de noite para conversarmos melhor sobre o assunto. Eu precisava ponderar com ela a necessidade, tempo, procedimentos e consequências no trabalho de parto para aquele corpo que não conhecia a indução. Se ela optasse mesmo pela indução, queria discutir sobre o inicio no procedimento durante a noite privando mais uma noite de sono. Mas, fosse como fosse, estaria com ela. Isso era o fundamental que eu queria deixar em seu coração.
Mas não há nascimento sem morte. Nem morte sem nascimento. A teia da vida nos diz. Ainda na terça, de tarde, Rosana teve de fechar um ciclo na vida. De rompante. Subitamente. Aquela mulher, inegavelmente guerreira e forte, pela primeira vez chorou na minha frente. E viveu seu luto. Miguel parecia esperar que a mãe deixasse partir os assombros de trás de sua porta. Ao nos despedirmos na terça, mais de onze da noite, o sentimento meu e de Suzana (melhor amiga de Rosana e sempre, sempre, sempre presente) era de que Miguel agora tinha o espaço que faltava para poder vir.
E na quarta-feira onde possivelmente a indução seria feita, às 4h30 da manhã, Rosana entra em contato. Contrações fortes. Ela não conseguia acompanhar os intervalos. Por telefone vimos, um pouco mais tarde, que tinham pouco mais de 5 minutos de intervalo. Cheguei na casa dela e o tumulto tomava conta daquele momento que deveria ser de paz e concentração. Rosana foi despersonificada por alguns que lá estavam. Fomos para o hospital em um contexto pra lá de inadequado para uma mulher em franco trabalho de parto. Foi perturbador. Não posso negar que a situação que vivemos entre a casa e o hospital também me abalou. Temi pelo o que viria e fomos em carros separados para o Hospital de Sobradinho.
Acompanhá-la ali já estava virando um desafio e eu não poderia entrar em um cabo de guerra junto dos outros presentes. Tentaram tirar a voz dela. Mas o fluxo da vida é forte, mas sereno. Não conseguiram. Dos seguranças a equipe de enfermagem do acolhimento, todo o carinho, cuidado (e limite) fizeram o tumulto passar. O pai de Miguel colaborou enormemente no fim do conflito instaurado.
E ela foi avaliada: 9 cm de dilação e colo totalmente apagado. No Centro Obstétrico e fomos recebidas de maneira muito amorosa, delicada e cuidadosa pela equipe de obstetrizes. A chefe da enfermagem, Ada (maravilhosa mulher!) ressaltou que ela teria toda a liberdade de escolher onde e como parir. Ela e Juliana nos acompanharam por quase todo o tempo. Só pediu para avisarmos casa fosse no banheiro para que pudessem trazer o necessário. O banheiro, enorme, tinha bola de pilates, cavalinho, barras, chuveiro... Rosana inicialmente queria fica no vaso. E assim foi feito. Ada fechou o registro para que a descarga não entrasse em funcionamento.
Rosana estava se sentindo fraca: havia dormido pouco nos últimos dias e se alimentado pouco. E dá-lhe mel. Horas depois, no segundo toque, os mesmos 9 cm e perceberam que na verdade o colo não estava apagado. Rosana oscilava entre o querer fazer algo que acelerasse o processo e a busca de algum descanso entre as contrações. Saímos do banheiro, fomos para a área reservada. Ampla liberdade de movimento. Mas naquele momento ela queria ficar deitada. A maca foi reclinada e os apoios dos pés colocados para ajudar na força.
As 11h26 chegou o cabeludo Miguel, pelas mãos da Juliana, nascendo também como parteira. Primeira vez minha, dela, do Miguel, da Rosana como mãe desse bebê. Chegou lindo, gordinho e guloso. Foi colocado imediatamente no colo da mãe. O cordão não permitia que ele chegasse ao seio. Esperaram, cortaram o cordão e ele veio com um chorinho de estranhamento do novo mundo que rapidamente passou. A equipe superou minhas melhores expectativas. Nenhuma intervenção, nenhum procedimento não informado e esclarecido.
Enquanto fui avisar ao pai e a Lavignia de sua chegada, o pequeno foi avaliado e passou pelos procedimentos padrão. Veio com um olhão observador, encarando todos e sugando tudo: lençol, mão, braço, dedo, peito. 50 cm e 3.820kg de muita gostosura.
Rosana lacerou. Segundo Ada, a profundidade de cortes bem inferior a episio que fizeram no parto da Lavignia. Apesar disso, foram momentos tensos o da sutura, apesar da anestesia. Avalio toda a experiência hospital do parto da Rosana como 98% maravilhoso. Tivemos dois breves momentos, com outras pessoas da equipe, de um pouco de falta de tato. Questões pontuais e que fazem parte da experiência humana. Não mudam a beleza do que foi.
Meu coração não cabe em mim: pela confiança da Rosana, por ter assistido esse sagrado nascimento, pela partilha desse acompanhamento, pelo olhar de doçura da equipe, pelos muitos aprendizados. Aprendi muito com aquelas mulheres. Passional que sou, tasquei um beijo na Ada (acho que ela assustou :p).
Rosana, pra você já disse e repito: gratidão, gratidão, gratidão, gratidão. Por compartilhar sua intimidade, suas dores, dúvidas, sua casa, seu corpo e seu parto. Não tenho nenhuma dúvida de que o “novo sempre vem” e que sua vida seguirá, com aprendizados, tropeços mas muita beleza. Bem vinda a nova vida, mulher linda, forte, que pode chorar e pedir colo. Que tem muita lindeza pra viver nesse plano. Emoticon heart
Milena Araguaia, a Raposa.

Por que precisamos de uma rede de apoio?

Nós, mulheres, lutamos muito para que fôssemos reconhecidas como indivíduos capazes, fortes, inteligentes. Tivemos que lutar pelo direito ao voto, ao trabalho, à remuneração justa. Nossa geração, especialmente, aprendeu que depender dos outros não é uma coisa boa, e que era preciso que estudássemos e trabalhássemos para sermos independentes, para não ficarmos à sombra de um companheiro. Tudo isso é lindo, gente, e na minha visão de feminista, corretíssimo.
Só que essa criação criou uma geração de mulheres que é centralizadora e que tem a mania de achar que dá conta de tudo sozinha. Não é nada incomum eu deparar com mulheres que trabalham 8 horas por dia, mantém a casa sem ajuda de diarista ou mensalista, fazem faculdade (ou pós, ou mestrado), cuidam de filhos, de marido... Aff, gente, isso é enlouquecedor, não é, não?! E nem é esse o problema que eu quero abordar aqui. O problema é que essa nossa geração foi ensinada a não demonstrar fraqueza. Isso significa que não só as mulheres andam fazendo isso tudo como sentem-se na obrigação de passarem por isso sem crise, sem choro, sem desabafos desesperados.
Só que somos seres humanos e, como tais, temos necessidade de socialização. Essas emoções reprimidas, engolidas porque temos que ser fortes e não compartilhadas uma hora explodem numa doença, num surto, numa briga feia. É necessário, sim, que compartilhemos nossas alegrias e dores com outros seres humanos. Só que para que isso aconteça, é necessário que encontremos no outro a empatia. Não vamos abrir nosso coração e falar sobre nossos problemas com qualquer pessoa, não vamos nos expor se tivermos medo de julgamentos vários.
Então a ideia principal aqui é que TODA MULHER precisa de uma REDE DE APOIO. De preferência de outras mulheres (porque nossa sociedade é, sim, machista, e um homem não terá a mesma empatia diante dos problemas femininos do que outra mulher terá) que estejam vivendo a mesma fase de vida. Então é muito bom que mulheres que estejam noivas, por exemplo, conversem com outras mulheres noivas sobre a preparação e sobre as emoções que antecedem o casamento. Essa é a ideia: buscar outras mulheres na mesma situação gera identificação, empatia e esclarecimentos maravilhosos.
Nosso foco aqui nessa página é gravidez, parto e maternagem, então é claro que precisamos ressaltar a importância de uma rede de apoio nesse momento. A gravidez vira nossa vida de cabeça pra baixo, é ou não é? Hormônios enlouquecem, o corpo muda totalmente, a relação com o companheiro muda, nossas perspectivas pessoais e profissionais mudam! Mulheres grávidas PRECISAM, PRECISAM MUITO, conversar com outras mulheres grávidas. E a empatia entre elas é poderosíssima.
Quando eu estava grávida da minha filha Alice, encontrei um grupo no orkut que tinha um tópico só para grávidas com DPP no mesmo mês da minha. Ali havia mulheres de todo o Brasil e até de fora dele, e começamos a conversar quando estávamos com uns 2 meses de gestação. A troca de experiências ali foi tão intensa que ficamos de fato muito amigas. Hoje escrevo esse post de São Paulo, onde vim me encontrar pessoalmente com essas mulheres para quem, até hoje, abro meu coração diariamente e a quem tantas vezes acolhi em seus desabafos.
Quero aproveitar, então, esse tema, para já deixar o convite para a nossa próxima roda de mulheres grávidas (sábado, 17/10, às 9h, no estacionamento 4 do Parque da Cidade) para vocês terem a oportunidade de também formarem a rede de apoio de vocês, com mulheres que saibam exatamente o que vocês estão vivendo. Se acheguem, porque a grande verdade é que juntas somos bem mais fortes!

Perdas...

Hoje eu gostaria de conversar com vocês sobre um assunto difícil, doloroso e cheio de tabus: perdas que sofremos durante a gravidez. Vou falar de experiências próprias e de casos que acompanhei, e de antemão peço perdão se despertar sentimentos ruins em quem me ler hoje, mas vejo que o fato de ninguém falar sobre essas coisas joga ainda mais sombra em cima da dor, quando ela acontece nessa fase.
Ninguém deseja, em momento nenhum, sofrer perdas. Queremos viver de ganho em ganho. Estamos pouco acostumados a sofrer, buscamos logo algo que nos alegre, seja uma droga, seja uma viagem, sexa o sexo, seja um remédio. Fugimos das perdas, fugimos da dor de todas as formas que podemos e conhecemos. Durante a gestação, então, principalmente se foi uma gravidez planejada, nos sentimos realmente as mais poderosas do planeta.
Mas as perdas vêm em algum momento, durante toda a nossa vida. E quando sofremos perdas importantes durante a gestação, parece que elas são ainda mais sufocantes. Afinal, muita coisa já está mudando e nós já estamos muito mais sensíveis do que o nosso habitual, e a perda pode ser mesmo avassaladora.
Quando eu estava grávida de 4 meses da minha Alice, cujo sexo eu ainda nem sabia. perdi meu irmão caçula em decorrência de uma cirurgia. Não quero entrar em detalhes de como tudo aconteceu, mas foi absolutamente devastador para mim e para minha família. Meu irmão seria o padrinho da Alice, e eu já tinha dito isso a ele, que ficou todo babão e orgulhoso. No meio da tempestade que foram os primeiros dias sem ele, eu ouvia muito coisas como "tenta não ficar triste, não faz bem pro bebê" ou "logo, logo vai chegar um bebê e vai devolver a alegria para essa casa". Tudo isso soava muito, muito absurdo. Como não ficar triste diante da perda de um irmão de 19 anos??? E numa boa, por mais que a chegada de um bebê seja motivo de alegria, como é que isso iria apagar a dor pelo fato de o meu irmão não estar lá para acompanhar tudo isso??? O melhor conselho que eu ouvi foi de um tio, que me disse: "Tá louca? Chora, sim! O que faz mal para o bebê é você ficar retendo as suas emoções, chore o quanto tiver vontade", e foi o único conselho que levei a sério. Sigo chorando até hoje, mas tenho certeza de que isso não prejudicou em nada os meus bebês.
Assim como eu sofri essa perda tão forte, conheci outras mulheres grávidas ou puérperas que passaram pela mesma dor. E é muito difícil conciliar os sentimentos contraditórios: a dor pela perda e a alegria pela chegada do bebê. Se estamos tristes, nos culpamos por não festejar a nova vida; se estamos alegres, nos culpamos por não chorar a vida que se foi. É importante deixar a culpa de lado, e abrir mesmo o coração para todos os sentimentos dessa fase. Eu lembro que pegava a Alice no colo e conversava com ela mesmo, dizia o quanto eu estava triste pela ausência do tio dela, mas que eu a amava muito, e que isso não diminuía a felicidade por tê-la. Muitas vezes chorei com ela aninhada em meu colo. É importante permitir-se sofrer e permitir-se sorrir.
Essa dualidade já não acontece quando o assunto é a perda gestacional, é um aborto. O aborto é um mergulho silencioso, dolorido, íntimo e cruel num sofrimento sem fim e pouco compreendido. Já no atendimento médico, as mulheres são obrigadas a ouvir coisas como "Ah, isso é super normal", ou "vocês são jovens, logo poderão ter outro bebê", e não entendem que a mãe começa a nascer assim que aqueles dois tracinhos aparecem no exame da farmácia. As pessoas em volta começam a contar dos abortos que sofreram ou viram outros sofrerem, a achar que a mulher que perdeu um bebê está "fazendo drama". Perder um bebê é uma dor muito, muito intensa.
E embora eu nunca tenha sofrido um aborto, tive uma experiência muito forte nesse sentido também, o meu primeiro atendimento como doula. Minha irmã estava grávida de 20 semanas. Uma noite, fomos a uma roda de grávidas que falava sobre trabalho de parto. No dia seguinte, ela mandou mensagem dizendo que tinha sentido contrações durante à noite, e que pela manhã teve um sangramento forte. Falei para ela ir para o hospital na mesma hora, e a médica já não conseguiu ouvir os batimentos cardíacos do bebê. Um ultrassom confirmou a perda. Eu nunca havia acompanhado um parto, e agora era minha irmã ali, em franco aborto, no mesmo processo de um trabalho de parto, mas para expulsar de seu corpo meu sobrinho já sem vida. Foi muita dor. Horas e horas de contrações, tentativas de alívio, tentativas de compreensão, tentativas de aceitação. Fiquei com ela do início ao fim desse processo que também me faz chorar ainda, e que foi a primeira vez que doulei na minha vida.
Não há consolo, sabe?! A aceitação da morte de um bebê não nascido ainda vem com o tempo e muitas lágrimas, e muitas vezes só há cura - nunca esquecimento - com outra gravidez e nascimento.
A verdade inexorável é que morte e vida são partes de um mesmo ciclo. São duas pontas de um mesmo milagre. E a nós, seres humanos pequenos e limitados, não nos cabe em nenhuma medida determiná-las, apenas aceitá-las com a maior serenidade possível. Essa página é sobre o surgimento da vida, porém é importante que possamos tão abertamente quanto falamos sobre partos, falarmos sobre nossas perdas e dores também. Sintam-se acolhidas, todas as mulheres que passaram por dores semelhantes a essas. Abraço fraterno de doula. E aquelas que quiserem compartilhar aqui suas experiências doloridas, façam isso. Ajuda a curar e ajuda outras mulheres que passam pelas mesmas dores.
(Elisa Costa)
"São só dois lados da mesma viagem
O trem que chega é o mesmo trem da partida
A hora do encontro é também despedida
A plataforma dessa estação é a vida"

Será que você é uma mulher do tipo super controladora?

Já falei algumas vezes, aqui, sobre a síndrome da super-mulher. Ela é observada nas mulheres atuais que, após a entrada no mercado de trabalho, passaram a acumular as funções externas com ainda total controle das funções de dentro de casa, ou seja,a mulher trabalha fora, cuida da casa, cuida dos maridos, cuida dos filhos, cuida de si. Mesmo quando ela consegue terceirizar algumas coisas (contrata alguém para os serviços domésticos, por exemplo), ela não abre mão do controle, querendo observar e ditar regras sobre tudo que a pessoa que assumiu a tarefa tem que fazer.
Quando uma dessas super-mulheres descobre-se grávida, essa necessidade de controle e programação impacta diretamente a gravidez (às vezes até mesmo antes dela, quando a mulher decide engravidar e controla muito sistematicamente seu ciclo, querendo determinar o início da gravidez), e ela vai buscar informações, incansavelmente. Estou falando aqui daquela mulher que não se conforma com as informações passadas pelo obstetra e pela doula, mas que pesquisa reportagens, relatos, artigos científicos, que sabe tudo sobre ovulação, concepção, todas as fases da gravidez, exames, parto, pós-parto, amamentação. Eu fui uma grávida assim, então falo de mim mesma também.
O lado bom de ser assim é que você não será enganada facilmente. Muitos médicos hoje utilizam-se de dados ultrapassados ou de falácias para induzir uma cesariana, ou atribuem um peso excessivo a uma pressão que sobe um pouco em uma aferição, e essa mulher que lê tudo e que controla tudo poderá rebater esses argumentos, discutir com mais propriedade, trocar de médico com mais segurança. Saberá melhor o que é bom para si e para seu bebê, optará por um parto mais natural e respeitoso, buscará com mais afinco uma equipe realmente humanizada.
Mas olha... Tem um lado ruim aí também. Nós, super-mulheres obcecadas pelo controle, podemos nos ver subitamente forçadas a abrir mão dele. Seja porque a gravidez não vem quando queremos, seja porque apresenta alguma intercorrência (aborto, descolamento de placenta, etc.), seja porque algo em nosso contexto familiar muda subitamente sem que possamos remediar (doença ou morte na família, divórcio, etc.), para quem busca controlar tudo a adaptação a esse tipo de intercorrência tende a ser muito mais difícil.
E mesmo que nada disso aconteça e a gestação transcorra lindamente, ao optar por um parto natural essas mulheres terão um grande obstáculo: parto é, em essência, a perda do controle. Você não decide a intensidade das dores, a velocidade com que seu corpo dilata, como seu bebê vai reagir ao trabalho de parto, a posição em que ele se encontrará. Você pode pesquisar, e se informar, e se comunicar com a equipe o quanto quiser durante a gravidez, mas, na hora do nascimento do bebê, quanto mais você controlar, mais vai atrapalhar o seu próprio trabalho de parto.
O pós-parto também tende a ser mais complicado para as mulheres controladoras. Porque pós-parto tranquilo é aquele em que a mulher pode se concentrar apenas nela mesma e no bebê. Mas se a mulher precisa trabalhar de casa, cuidar dos afazeres domésticos, dentre outras atribuições estranhas ao binômio mãe-bebê, mais turbulento tende a ser esse período.
Meu conselho? O de sempre - buscar o equilíbrio. Pesquisar sempre, se informar muito, sim, claro. Mas se você tem muita dificuldade em abrir mão do controle, vale a pena buscar ajuda de um psicólogo para trabalhar essa questão, ou, ao menos, buscar terapias alternativas para desligar um pouco esse lado racional: biodanza, yoga, meditação, etc. Quem controla demais costuma achar tudo isso uma "besteira", exatamente por ser excessivamente racional, mas creia: trabalhar o emocional e treinar o 'desligamento' do controle é tão importante quanto saber tudo sobre parto.
(Elisa Costa)

Roda de paridas

E na quarta-feira, 21/10, tivemos mais uma linda roda de paridas. Cinco bebês e nove mulheres compartilhando sobre as experiências dos partos reais frente as expectativas da gestação, a nova interação entre os membros da família, as rotinas e desafios do puerpério. Gratidão Ana Paula por ter nos acolhido em sua casa. Gratidão mulheres pela partilha e aprendizado.





Qual a diferença entre parto vaginal e parto natural?

A primeira vista, parece que os dois termos são sinônimos, não é mesmo? Tendemos a acreditar que existem apenas duas opções para o nascimento de um bebê: cesariana ou parto normal.
O parto vaginal é aquele, como o próprio nome remete, acontece pela vagina porém pouco dele é realmente normal. São partos que têm o pressuposto da medicalização, passando por intervenções muitas vezes desnecessárias. Posição restrita ou deitada, jejum, hormônio sintético, manobras, episio, puxos dirigidos ... o rol de procedimentos é extenso. Parte dessas intervenções pode até ser necessária, o problema é o uso padronizado e indiscriminado. A maioria das mulheres que me relataram partos normais traumáticos foram vítimas desses procedimentos que não respeitaram o tempo do trabalho de parto nem a autonomia da mulher e seu corpo.
No parto natural a lógica é da intervenção mínima e quando necessária. A mulher tem possibilidade de realmente conduzir sua experiência de parto e no tempo demandado pelo seu corpo e do bebê. Não se trata de parto desassistido, mas sim visto como fisiológico e sem o princípio intervencionista.
Milena Araguaia - a Raposa

Taxas de cesariana nas maternidades de Brasília



Parir nessa cidade não é fácil. Disso a gente já sabia. Os hospitais particulares são campeões de cesarianas. Disso a gente também já sabia. Mas seguem abaixo as taxas de cesariana (que segundo a Organização Mundial de Saúde devem girar em torno de 15%) dos principais hospitais de Brasília. Se você está na vibe "parir com o plantonista", é bom observar bem.

Por que o ambiente influencia a duração e a qualidade do trabalho de parto?

Por que o ambiente influencia a duração e a qualidade do trabalho de parto?
Como doulas, uma das nossas principais funções é cuidar do ambiente do parto. Estamos sempre apagando a luz, lembrando as pessoas de evitarem conversas paralelas, pedindo silêncio durante as contrações, colocando uma música agradável, usando um óleo essencial para tirar o cheirinho de hospital do quarto... Mas por que isso é tão importante, você sabe?
A primeira coisa a entender é que o trabalho de parto e o nascimento são uma verdadeira revolução hormonal nos organismos da mulher e do bebê. Os hormônios é que controlam tudo: contração, dilatação, expulsão, lactação, tudo é ditado por quatro hormônios principais: ocitocina, endorfinas, epinefrina e prolactina. Esses hormônios são os mesmos para todos os mamíferos, ou seja, é o momento em que nos igualamos a todos os animais que gestam e parem.
Mas há algo que nos diferencia essencialmente de todos os animais que gestam e parem: nosso neocórtex, que é o nosso cérebro racional. Os animais deixam-se guiar basicamente pelos seus instintos, não ficam questionando tanto e pensando tanto como nós, humanos. Naturalmente, os animais procuram um local mais reservado, escuro e tranquilo para parir, e não questionam como nós, aceitam o processo e se entregam a ele, porque é natural.
Já nós, mamíferas humanas, vamos parir em um hospital. Muita luz, muita gente entrando o tempo todo, perguntando coisas, nos obrigando a ficarmos com o nosso racional ligado. Dessa forma, nosso neocórtex funciona mais do que o nosso sistema límbico (essa parte primitiva e irracional do cérebro, que dá ordem para liberação dos hormônios do parto), o que tende a gerar um trabalho de parto mais longo e dolorido.
Para que o trabalho de parto seja mais prazeroso e que a sensação de dor seja aliviada, é preciso que o nosso neocórtex fique o menos ativo possível, ou seja, que a mulher consiga se concentrar no processo sem ser solicitada o tempo todo, sem ter que ficar racionalizando o que está acontecendo. Por isso a atmosfera de silêncio e privacidade, com pouca luz e pouca conversa, ajuda nessa mudança do funcionamento cerebral: se essas forem as condições do momento, a mulher será capaz de, por puro instinto, escolher posições, movimentos, sons que a ajudarão a parir da forma mais confortável possível.
Assim, a doula vai ajudar essa mulher a ter o máximo possível de privacidade e tranquilidade durante o seu trabalho de parto, preparando um ambiente confortável e orientando os presentes a respeitarem esse momento tão grandioso. Eu perco a conta de quantas vezes apago a luz e de quantas vezes digo "Espera a contração passar?" para a equipe de enfermagem. E todas as mulheres que já pariram podem confirmar o quanto isso é importante! Doula já! kkkkkkkk
(Elisa Costa, com imagem do blog felizparto.blogspot.com.br)

Pobre fazendo pobrice



Se amamentar o filho ao seio, nutrindo-o com o alimento mais completo que existe, é pobrice, minhas doulandas estão me matando de tanto orgulho, fazendo muita pobrice todo dia!

Vai ter bebê mamando no peito, sim! Nós, da Poder de Parir, incentivamos demais as mães a amamentarem seus filhos em livre demanda, a amamentarem onde quiserem (porque se a mulher precisa se ausentar para dar de mamar sozinha num canto, a amamentação tende a ser algo bem mais pesado do que se ela puder simplesmente botar os peitos pra fora e pendurar o bebê, hehehe), a amamentarem pelo maior tempo possível.

Leite materno é saúde! Bebê pendurado no peito está recebendo alimentação completa e muito amor!

Adoro vocês, minhas pobres preferidas!

Por que fazer um plano de parto?

O plano de parto é um documento em que a mulher grávida e seu/sua acompanhante expressam todas as suas vontades em relação ao parto. Este documento deve ser protocolado no hospital, com o pedido de que seja anexado ao prontuário da mulher grávida, ficando uma cópia com a mulher e uma com a doula.
A elaboração do plano de parto faz com que a mulher pesquise e entenda assuntos sobre os quais os obstetras não costumam ter tempo de conversar durante a consulta. Coisas como maneiras de indução de parto, episiotomia, possibilidade de uma cesariana, analgesia de parto, dentre outros. Preenchendo o plano de parto, a mulher fica muito mais bem informada e capaz de tomar decisões conscientes quanto ao próprio corpo e ao seu bebê.
Além disso, o fato de ter suas vontades expressas em um documento faz com que as pessoas da equipe não possam usar a desculpa do "eu não sabia". Se a vontade da mulher for desrespeitada, a base para uma reclamação formal ou processo está bem delimitada. Em tempos de tanta violência obstétrica, isso é uma grande segurança.
Deseja fazer seu plano de parto? Busque um modelo na internet ou entre em contato com a nossa equipe, será um grande prazer te ajudar!
(Elisa Costa)