Muitas mulheres superestimam sua capacidade de lutar contra o sistema. Eu sempre digo que parir nesse país é uma guerra, e infelizmente muitas mulheres só entendem a dimensão do que eu digo após se frustrarem com o nascimento do bebê.
O primeiro inimigo a ser derrotado é o médico do convênio. Se você acha que o seu médico do convênio é especial e diferente de todos os outros, peça para ver os números dele: no último ano, quantas cesarianas e quantos partos normais? Porque meninas, o médico do convênio não é um vilão que gargalha nas suas costas enquanto marca a cesariana, mas, de uma forma geral, eles perderam o hábito de acompanhar partos e de não intervir, a não ser que haja uma necessidade real. Então você vai chegar ao final da gravidez, super sensível, super ansiosa, tendo que lidar com seus próprios medos que já não são poucos, e você vai ter um médico procurando “pelo em cabeça de ovo”, porque ele também está com medo e jamais vai admitir isso. Vai te mandar fazer 500 ultrassonografias, vai se mostrar mega preocupado com aquela pressão 13x9, e isso vai minando a sua confiança de que é capaz de parir. Não é por mal: o problema é que a maioria dos médicos de convênio está acostumada a fazer cesáreas eletivas, só isso. Ah, Elisa, mas uma equipe humanizada é muito, muito caro... Mas caro do que eu sou capaz de pagar... Eu te entendo, eu fui uma dessas também. Dessas e de tantas outras que eu conheço que achou a equipe humanizada muito cara para um primeiro parto e pagou para o segundo, por perceber só tarde demais o quanto é importante. Mas se de todo você não tem condições de pagar, lute contra um outro inimigo: o medo do SUS. Porque o pré-natal do SUS dá de 10 no de qualquer médico de convênio, e no SUS eles não te empurram cesarianas desnecessárias. A partir disso, basta se informar sobre os melhores hospitais e como fazer para conseguir atendimento neles (olha a doula aqui, kkkkk).
O segundo inimigo a ser derrotado é a família. Dói, né?! Porque são as pessoas que mais te amam, as pessoas que você mais ama, a opinião deles tem um peso muito grande. E eles não entendem de parto, mas se preocupam muito com você e com sua saúde. E o senso comum diz que a cesariana é mais segura do que o parto normal, embora todos os estudos e estatísticas provem justamente o contrário. Na cabeça da sua família, é arriscado esperar além das 40 semanas. Na cabeça da sua família, você é muito fraca para suportar as dores do parto. Na cabeça da sua família, você é muito frágil para tudo isso. Novamente, não é por mal. É amor, só amor. Mas sua autoconfiança vai sendo minada, e de tanto ouvir as pessoas que você ama dizerem que você está errada, você começa a ter medo de estar exagerando no desejo por um parto normal.
O terceiro inimigo são as informações equivocadas. Principalmente relatos de partos normais mal sucedidos, geralmente contados pelas metades. O bebê que ficou entalado e tiveram que cortar a cabeça, o bebê que passou da hora e morreu na barriga, a moça do parto humanizado que morreu porque insistiu em ter bebê em casa... Nossa, quantos filmes de terror, quantos fantasmas, quantas histórias horríveis as pessoas adoram contar para as grávidas... E por mais que conscientemente você saiba que tudo isso é um absurdo sem tamanho e que com certeza a história contada não foi bem daquele jeito na realidade, esses absurdos ficam ali no seu subconsciente, virando medo de parir.
O quarto inimigo é a ilusão do parto sem dor. Quando uma mulher está buscando um parto natural, ela vê infinitos vídeos de parto, principalmente parto em casa, e lê infinitos relatos também. Esses vídeos e relatos mostram o parto da perspectiva que a gente tem quando ele acaba: maravilhoso, transcendental, redentor, melhor coisa da vida. Isso significa que a dor, a dor física, a dor do parto, é relativizada, porque quando tudo acaba ela se torna apenas parte de um processo muito maior e mais bonito do que a dor em si. Só que quando o trabalho de parto tem início e durante longas horas, o que a mulher tem é a dor em si. Muita dor. Muita dor mesmo. E não estamos preparadas para ela, nunca estamos. As longas horas de trabalho de parto são regadas a lágrimas, medo, arrependimento, desejo de fazer qualquer coisa que ponha fim àquilo. Se você não tiver pessoas empoderadas e carinhosas que te segurem a mão e te repitam constantemente que você vai conseguir, que aquilo vai passar, você desiste de tudo mesmo. O trabalho de parto tem que ser acompanhado de muito abraço, de muitas palavras positivas, de muitas músicas inspiradoras, para que a dor seja suportável, para que você atravesse a dor, coloque seu bebê no mundo e entenda porque, afinal de contas, a dor não é esse fantasma todo.
Então o quinto e principal inimigo é você mesma. Porque só você é que pode se convencer a não cair nessas armadilhas que eu descrevi acima. Só você é que pode decidir que é importante, sim, ter uma doula. Só você é que pode chegar para o seu médico do convênio e pedir os números dele sem medo de ser indelicada. Só você pode insistir e informar seu/sua acompanhante para que ele/ela seja aliado/a e não mais um inimigo a enfrentar. Só você pode mandar quem vem com histórias horrorosas calar a boca, dizer que não quer ouvi aquilo. Só você pode tomar a decisão de mudar de médico durante a gravidez. Só você pode decidir ter convênio e mesmo assim ir parir no SUS. Só você pode decidir que vale a pena procurar um grupo de apoio, frequentar rodas de grávidas. Cabe a você. Enfrente-se, encare essas realidades, e conte comigo para te orientar e segurar a sua mão.
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